sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Coração de tinta, Cornelia Funke

(Skoob)

"O livro que ela começara a ler estava debaixo do travesseiro. Cutucava o ouvido dela com a ponta da capa, como se quisesse chamá-la de volta para suas páginas. "Oh, deve ser mesmo muito confortável dormir com uma coisa dura e pontuda debaixo da cabeça", dissera seu pai na primeira vez em que encontrara um volume sob o travesseiro dela. "Confesse, à noite ele sussurra histórias no seu ouvido." " Às vezes, sim!", respondera Meggie. "Mas só funciona com crianças." Em troca, Mo lhe dera um beliscão no nariz. Mo. Meggie nunca chamara o pai de outra maneira.

Naquela noite, em que tanta coisa começou e tanta coisa mudou para sempre, um dos livros favoritos de Meggie estava debaixo de seu travesseiro. Como a chuva não a deixava dormir, ela se sentou, esfregou os olhos e pegou o livro. As páginas farfalharam cheias de promessas quando ela o abriu. Meggie achava que esses primeiros sussurros soavam de maneira diferente em cada livro, conforme ela soubesse ou não o que ele lhe contaria. Mas agora era preciso providenciar luz. Havia uma caixa de  fósforos escondida na gaveta do criado-mudo. Mo a proibira de acender velas à noite. Ele não gostava de fogo. "O fogo devora os livros", ele sempre dizia, mas afinal de contas ela tinha doze anos e podia muito bem tomar conta de algumas chamas. Meggie  adorava ler à luz de velas. Ela havia posto três pequenas lanternas e três castiçais no batente da janela. E estava justamente encostando o palito de fósforo aceso num dos pavios já queimados quando ouviu passos lá fora. Assustada, Meggie apagou o fogo com um sopro - ela ainda lembrava nitidamente depois de muitos anos -, ajoelhou-se em frente à janela molhada pela chuva e olhou para fora. Foi então que ela o viu.

[...]"

#Flora

0 comentários:

Postar um comentário